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Carlos Pinheiro
 
31.08
A Pedra Elefante

Era pedra enorme. Ficava no meio da rua chamada Matança porque, nela, matavam animais a céu aberto. A cidade cresceu e empurrou a matança para mais longe do Centro e a rua passou a se chamar 10 de Novembro, em homenagem ao sargento-mor Bernardo Vieira de Melo, devido ao primeiro grito de República do Brasil e das Américas em terras de Olinda, por isso, se diz que a República é filha de Olinda. Mas, em Caruaru, virou rua das quengas, das raparigas, das mulheres ninfomaníacas, das mulheres de vida fácil. Imagina! Hoje, Rua Porto Alegre.

Porém, onde frutificam mulheres livres germinam os poetas, proxenetas, trovadores, violões, serestas e se alastram prazeres, brigas, amores e histórias absurdas. A Pedra Elefante tinha tromba invadindo calçada do Cabaré da Luz Verde, e servia de palco à poesia espontânea e popular de Caruaru. Era nela que o cancioneiro Belísio Córdola, paraplégico, largava as muletas, escalava a pedra qual lagartixa em lajedo e declamava poesia para Tâmara, a mais bela e desejada rapariga de toda a história de Caruaru.

Naquela noite de festa, coube o privilégio de noitada com Tâmara, pagar antecipadamente à cafetina, ao invejável Zaidan, e adjetivos negativos sobre o trovador caruaruense eram desferidos por pura inveja por aqueles que não versavam em prosa nem em verso, e não desfrutariam naquela noite das odes sob os lençóis da bela morena dos olhos verdes e cabelos negros, longos até a cintura. Principalmente Rui Rosal, Maninho Pinheiro e Nelson Barbalho, que não possuíam dinheiro para serem teúdo e manteúdo da enigmática mulher. Este dispendioso privilégio pertencia ao jogador Esquerdinha.

O casal adentrou a Festa do Comércio, passando pelo Beco da Estudantil, que é assim nominado quando descendo; se subindo, passa a ser Beco da Pequena de Ouro, esquisitices dos filhos desta terra maravilhosa. Crianças levavam à cabeça, cadeiras colocadas à borda do "Quem Me Quer", passeio da sociedade, para acomodação de mães vigilantes às filhas arrodeando pela calçada; o ceguinho da gaita tocando na calçada da Ray Fay de Djalma Lourenço e da deslumbrante Graça… Era Caruaru em festa com a igreja iluminada pelo velho Teixeira marcando a passagem de ano.

Na entrada do beco, já se sentia o cheiro inconfundível, saboroso e inesquecível do cachorro quente do Parque Caruaru. Ao comer cachorro quente, pingou graxa na blusa branca. Vaidosa, Tâmara, retornou ao Cabaré. Ela não atendeu a clientela naquela noite alegando indisposição alimentar, pois comera peixe e estava com o estômago embrulhado, tomou chá de boldo e foi dormir. Parece mentira essa história, mas não é. Numa cidade onde D. Santinha era a quenga do Coronel Prefeito e mandava prender e soltar qualquer pessoa, tudo é possível.

Vê se pode?

 
 
 
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